domingo, 29 de maio de 2011

Enfim, uma postagem..


Mocidade e vida

Lembras, trovador? Foste peregrino...
E só, e só, aos pampas recitaras
Tinhas a fronte - pelo sol banhada
Por berço - o campo... Por platéia - araras
Qu'importa? Um dia do horizonte o cume
Há de alongar ao sol poente a vida
Caíste mártir... Ver-te-ão de pé:
Cingida a face numa estátua erguida!...

Larga harmonia me corrompe n'alma!
Escuta! Aflora o pipilar das aves!
À sombra fresca, já morrendo o dia...
Hei de sentir ondulações suaves!
Já viste às vezes quando a lua cheia
Às meias noites a campina doura?
Murmura a rola: "Como a lua brilha!"
Responde o ramo: "Faz bem p'ra lavoura!"

Vós, que escutais a poesia a flux,
O salmo antigo de Davi a Deus,
Notai agora... Como a chuva - os versos -
Rútilos rolam dos augustos céus!
Oh trovador! Vaguemos pelos cerros!
Aqui descansam minhas crenças nuas...
E qual na nuvem, que o palor repousa,
Ei-las aqui: ei-las as crenças tuas!

Ouve, trovador! Ouve... Já cerrou-se...
A concha que o futuro anunciava
Sonhaste a pátria, a liberdade, a história?
Verás a sorte que o porvir lhe crava!..
Ontem... No lodo que lhe encobre o gênio...
Pois como o pobre - teu pudor cantaras
Tinhas a fronte - pelo sol banhada
Por berço - o campo... Por platéia – araras

Qu'importa? Um dia do horizonte o cume
Há de alongar ao sol poente a vida
Caíste mártir... Ver-te-ão de pé:
Cingida a face numa estátua erguida!...
Oh! É tarde, é muito tarde, 'Stambul chama
Alça a bandeira, Don Juan espera!
Oh véus! Oh noites de hibernais poemas!
...Já me foge a razão na primavera!..


29 de Maio - 2011

Por Salomão Guerra

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(...)
Que eu digo ao ver tua celeste fronte:
"O céu consola toda dor que existe.
Deus fez a neve — para o negro monte!
Deus fez a virgem — para o bardo triste!"
CASTRO ALVES



Tu que passas, descobre-te! Ali dorme
O forte que morreu.
A. HERCULANO (Trad.)

domingo, 1 de maio de 2011

Uma motivação a mais!

* A partir de algumas comunidades que possuo no Orkut - relacionadas à literatura em geral - fui achado por uma revista literária online de nome Macondo, que disponibilizou um e-mail para que até final de março enviássemos (eu e todos aqueles que produzissem qualquer tipo de arte relacionada à literatura) alguns de nossos feitos. Graças a Deus, tive a oportunidade de ter dois poemas meus selecionados, dentre 5 que enviei. Portanto, na 1ª edição online é possível vê-los (pg. 18) compondo a revista. Em virtude da necessidade de ajuntá-los em uma mesma página, a disposição dos versos foi alterada, o que na verdade não deveria ter ocorrido.

Infelizmente, na parte dos colaboradores, ficou apenas meu nome/e-mail, visto que não me dei conta de fornecer detalhes complementares a meu respeito.

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Nessa revista vemos contos, resenhas, poesias, haicais, charges etc.
Para os interessados, vale a pena uma olhada:
http://pt.calameo.com/read/000678515a33943879079

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Numa atualização posterior colocarei algum poema meu, já que por ora tenho apenas um em andamento, inacabado. Além disso, confesso me faltar muita vontade de terminá-lo, perdi por ele o interesse, o encanto, mas não o deixarei engrandecer a lista dos meus "poemas esquecidos".

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Chameleons feed on light and air: Poets' food is love and fame.
SHELLEY



Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.


Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
AUGUSTO DOS ANJOS





quarta-feira, 13 de abril de 2011

Inovando

Esta, agora, em redondilha maior:

Canto à primavera

J’aime, et je veux sentir sur ma joue amaigrie
Ruisseler une source impossible à tarir.
                                                  A. DE MUSSET

Na primaveril aurora
Como enleva o descansar
Sentindo os raios de sol
Que a face põem-se a banhar
Quando a brisa matinal
Nas sombras do laranjal
Desta primavera austral
No rosto vem passear!

Quisera a dama-da-noite
À luz do esplendor do dia
No outono, verão ou inverno
Florir como ora se espia;
Tão logo o inverno se encerra
Não fosse esta primavera
Que a flora recompusera
Emurchecida seria!

E como no balouçar
Duma rede e o cortinado
De nuvens bem alvadias
À noite me vejo alçado;
Decerto co’assaz beleza
Defronte da natureza
Cantigas lá de Veneza
As aves têm ensaiado!

E quando co’ímpeto ondas
À flor da areia embalavam
Na tarde que desfalece
Mais poesia inspiravam;
Ouvindo-as nos recitais
Com as velas nos castiçais
Mancebos tais sem iguais
À primavera saudavam!

Abril 2011

segunda-feira, 4 de abril de 2011

De volta ao século XIX!

É evidente que tenho remado contra a maré. A preocupação formal nos versos nunca foi tão old-fashioned como o é hoje, suplantando até a breguice de se usar estrangeirismos. Parece que os versos brancos e livres, junto às muitas temáticas atuais que associam subjetividade a assuntos mirabolantes, instauraram um regime totalitário no Reino da Poesia desde que assumiram seu trono, durante revoluções nas quais subdesenvolvidos conseguiram vencer os desenvolvidos; e, desde esses triunfos, ordenaram à guarda real ser proibida a entrada de qualquer obra que remetesse aos contra-revolucionários, isto é, que contivesse traços tradicionais do fazer poético dos séculos anteriores. Ah, contra-revolucionários! Quem dera o fossem! Dizem que o calor, ao sabor do caminhar das patinhas dos vermes sobre suas faces, justamente a realidade encontrada nos túmulos do Brasil e, geralmente, por aí afora, serviu-lhes de inspiração; renunciaram o bom combate e deixaram-se sepultados, entornando amores, sentimentos, e descrições nas folhas que restavam, tendo de leitora a magnífica terra, um dos quatro elementos do universo!
Que honra deve lhes ter sido tê-la de todo ouvidos.

***

De qualquer forma, seguirei fazendo, muito obviamente, o que gosto. Como disse Waldo Motta:

“Não quero ser poeta de que todos se orgulham. Descaradamente confesso a quem interessar possa: Quero é ser a vergonha da província e da república.”

***

Influenciado, entre outros, mas principalmente por Álvares de Azevedo, fiz "Índia". Segui a temática muito bem trabalhada por ele, além de incorporar à poesia o esquema de rimas (ABCB) muitas vezes visto em sua obra relativamente longa. Falando em preocupação formal, não poderia ter esquecido da métrica. Novamente os versos decassílabos consomem todas as estrofes... Voltemos ao século XIX.




Índia      

Como é ligeira, índia das campinas!
De doce aroma inunda a mata bela...
E sob o infalho alvejar da lua
Beijava o vento as negras tranças dela

Deixai que colha os ramos! Deixai ela   
No mar de rosas languidez cheirosa
Sentir roçar-lhe o coração gelado...
Sentir purpúrea sua tez formosa!

E de seus lábios, no fulgor aéreo
Da tenra lua em nuvens d’alvorada
Fluíam segredinhos aos jasmins...
Por alguém certamente enamorada!

Banhava-lhe de certo enlevo a íris
Da aveleira a avelã já tão vistosa...
Oh! Não me encares co’esse teu olhar
Flor d’esperança – morrerei nas rosas!

Quem me dera, meu Deus! Se no ocaso
Se na saudade do arrebol um dia...
Adormecesse no meu peito morto
A fronte jambo dessa moreninha!

Jazia só, e o cintilar da lua
Lembrando as noites de febris paixões
Gentis amores fê-la derramar
No leito agreste das consumações...

E suspirando a rude brisa morna
Que os céus enviam ao sol do meio-dia
Da relva mole faz seu travesseiro
Beija-lhe o sono as pálpebras sombrias...

Que me resta, meu Deus! É triste alento
O tempo que verti a contemplando...
Sonhava mais! Talvez um beijo apenas
Fosse o bastante e eu morreria amando!

Abril 2011

sexta-feira, 18 de março de 2011

Without further ado




Canto do Cisne

Cantando a vida como o cisne a morte
                                           BOCAGE

Último canto, extenuada vinha
Já da vida cansada a descorada
Ave. Vinha assim – tão amargurada!
Teu aspecto duros lamentos tinha...

Bravo! Que melodia ressoava!
Lembrava os feitiços de Iara – e tanto
Em derredor era da flora o encanto
Que o outono flores já não desbotava!

Belo exemplo! Divinal criatura!
Que possa o homem em sua jornada
Por inconstância e decepções marcada
Viver e cantar com igual ternura!

*****

A semelhança entre esse meu poema e a imagem na verdade é quase ínfima, isso porque procurei uma imagem que se adequasse ao poema, ao passo que o oposto talvez fosse mais conveniente, isto é, converter desenho em palavras. Bom, nem reparem.

Logo abaixo deixo um poema de Alberto de Oliveira, um dos pilares da chamada tríade parnasiana , e que se destaca dos demais parnasianos por ser o mais ortodoxo, ou seja, o mais tradicional, que segue à risca os princípios norteadores desta corrente literária - Parnasianismo. Ah, o motivo pelo qual posto o poema é que simplesmente achei-o engraçado e talvez ingênuo, ou não.


Terceiro Canto (terceira parte)


Cajás! Não é que lembra à Laura um dia
(Que dia claro! esplende o mato e cheira!)
Chamar-me para em sua companhia
Saboreá-los sob a cajazeira!

— Vamos sós? perguntei-lhe. E a feiticeira:
— Então! tens medo de ir comigo? — E ria.
Compõe as tranças, salta-me ligeira
Ao braço, o braço no meu braço enfia.

— Uma carreira! — Uma carreira! — Aposto!
A um sinal breve dado de partida,
Corremos. Zune o vento em nosso rosto.

Mas eu me deixo atrás ficar, correndo,
Pois mais vale que a aposta da corrida
Ver-lhe as saias a voar, como vou vendo.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Façam suas escolhas

(...) enivrez-vous; enivrez-vous sans cesse! De vin, de poésie ou de vertu, à votre guise.
(...) embriagai-vos; embriagai-vos sem cessar! De vinho, de poesia ou de virtude, à vossa escolha.

                                                                                                    CHARLES BAUDELAIRE


O trecho acima, de Baudelaire, um dos ícones do Simbolismo mundial e grande influente de Cruz e Souza, recomenda a embriaguez... Na verdade, não sem motivo. O fragmento que antecede o exposto acima aconselha: "Para não serdes os escravos martirizados do Tempo, embriagai-vos;".
Em razão deste duro motivo que justifica a ebriedade, e partindo-se da premissa de que essas palavras ecoam de lábios dignos de reconhecimento (Baudelaire, juntamente com Rimbaud e Mallarmé, representa o que há de melhor no simbolismo francês), façam suas escolhas e embriaguem-se...


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Vinha há uns dias trabalhando num poema de nome "Leviatã", cujo assunto central é justamente esta besta fera dos mares. No entanto, muito tempo (talvez uns 3 dias, haha) com os esforços voltados a esse mesmo poema me cansou... Portanto, já faz cerca de duas semanas que está intacto. De qualquer forma, postarei um pequeno trecho do poema e, quando pronto, todas as estrofes.
O tédio de "Leviatã" me conduziu a fazer um outro tipo de poesia, na qual trabalhei com um assunto mais infantil, além de ter deixado de lado certos formalismo, apesar de ter mantido os versos decassílabos que aprecio, que podem ser vistos em "Leviatã" e "Sentimentos Verdadeiros", do post anterior. Infelizmente, os rumos que o fazer poético tomou a partir de 1922- com a Semana de Arte Moderna- até os dias de hoje, não me agradam muito.. Contudo, tentando me adequar aos novos parâmetros é que fiz essa poesia: O pique-esconde acaba bem. O resultado foi desastroso, além do mais, a poesia me pareceu meio confusa quando a li após terminada, mas, sinceramente, faltou foi muita disposição para reparos.


Trecho de Leviatã – intrudução e primeira estrofe da 1ª parte:


Leviatã

Ah meu Deus! Senhor dos Céus! Compadece-te!
Afoga na amplidão dos ares isto!
Recordações, vivências, inda queimam
Como velas em chamas infinitas!.......

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1ª parte
Ia-se assim a embarcação Cubana
Resvalando, no Cáspio, sobre as vagas
Gozo constante.. e o tilintar das taças
Era o vestígio de alegria insana!...


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O pique - esconde acaba bem

Esconde-se o lápis, foge o papel
Ambos se juntam nesta brincadeira
E nestes dias, nestes sóis de fel
Chora o poeta desta manha arteira!

Onde cravar os versos juvenis?
Como escrever – se o lápis faz-se ausente?
Isso questiona-se em angústia, e sente
Um bom pressentimento... Está feliz!

A brancura do sorriso p’ueril
Em alívio oportuno – reluzia
O amargo se fez doce... E presumiu:
“Ah! Acho que fiz uma poesia!”



Até a próxima!

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Cara à tapa

"A justiça é como a cobra: só morde os pés descalços."

Acima, frase do já falecido Óscar Romero, sacerdote salvadorenho que se dedicou às funções na Igreja. Foi numa palestra de Direito que pela primeira me chegou aos ouvidos seu parecer sobre a justiça, comparada à cobra talvez por intencionalidade e com intenções implícitas. A comparação me remete, nesse momento, à passagem bíblica que nos revela o caráter traiçoeiro do réptil, quando incita Adão a comer a fruta proibida, desobedecendo a Deus. A justiça, na maioria das vezes, sem margem de erros, também é traiçoeira e eu te digo: não queira cair em suas mãos.


Vamos ao que interessa:
Há cerca de uma semana fiz um poema cujo objetivo a princípio era imprimir a ele traços mais sentimentais.
Buscava fazer algo nos moldes de "Soneto do Anjo" de Álvares de Azevedo, porém consciente da quase impossibilidade de escrever tão inspiradamente quanto ele. De qualquer maneira, os rumos foram outros. Decidi fazer alguma coisa até certo ponto irônica, uma espécie de morde-e-assopra, em versos nos quais houve exaltação da beleza, somada à menção da loucura da personagem central. Além desta, postarei uma outra poesia, bem simples, que fiz há uns 5 meses. Foi uma das minhas primeiras. Ei-las (isso é feio demais e foi de propóstio!):


Sentimentos verdadeiros
Eu a vi... minha fada aérea e pura,
A minha lavadeira na janela!

                        ÁLVARES DE AZEVEDO

Em suaves contornos esculpida
De alvo sorriso, embalsamado em lábios
Purpurinos – brilhas, qual Sagitárius
Casta e formosa, mas endoidecida!

Cândida musa, pálida esperança!
Que terrível é tua insânia bruta...
Inda mais sofre, aquele que perscruta
Teus planos.. onde a insensatez descansa!

Virgem donzela... virginal doçura!
Estampa na beleza e na loucura
A ironia antitética dos Astros

Lembras Afrodite – no encantamento
O Dom Quixote – em vagos pensamentos
E a Ismália louca – reduzida a cacos!


Obs: Ismália nomeia e faz parte de um poema de Alphonsus de Guimaraes.
Obs2: A parte logo abaixo do título, fragmento em itálico de "É Ela!" de Álvares, é apenas uma epígrafe, espécie de nota introdutória ao poema de minha autoria que vem depois.

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Ela

Quão preciosa és tu- inacreditável!
Não tens gosto ou cheiro
Mas homens lutam por ti
Sorte tem o Brasil
Aqui estás em abundância
Sob o Aqüífero Guarani

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Até!

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Introdução inaugural

Bebamos! Nem um canto de saudade!
Morrem na embriaguez da vida as dores!
Que importam sonhos, ilusões desfeitas?
Fenecem como as flores!
                                               BONIFÁCIO


O que dizer?
Bom, apesar de não gostar, recorri ao blog simplesmente por tê-lo como uma espécie de "quadro" para meus rabiscos e melhor, um quadro virtual, distante das imperfeições de seu primo, o quadro negro, figura arcaica limitada a ser vista pelos "mesmos de sempre"- embora em razão da inexperiência deste que escreve, que salta aos olhos no correr das linhas de seus poemas, haja receio de não ser acessado até pelos "mesmos de sempre". Até? Isso seria muito!
Seguindo a tendência do ditado "a primeira impressão é a que fica", convinha que eu postasse o meu melhor poema, o soneto mais harmonioso, de escolhidas palavras, para, quem sabe, tê-los, vocês, novamente aqui. De qualquer forma, nada de muito interessante tenho ainda.
Via uma notícia sobre a recente confusão no Oriente e me lembrei de um poema de Augusto dos Anjos, uma espécie de poeta parnaso-simbolista. Por ora, é o que deixo, com a omissão de duas estrofes, que não me agradam muito!
Não se turbe no túmulo, Augusto!


UMA NOITE NO CAIRO

Noite no Egito. O céu claro e profundo
Fulgura. A rua é triste. A Lua cheia
Está sinistra, e sobre a paz do mundo
A alma dos Faraós anda e vagueia

Os mastins negros vão ladrando a lua...
O Cairo é de uma formosura arcaica.
No ângulo mais recôndito da rua
Passa cantando uma mulher hebraica

O Egito é sempre assim quando anoitece!
Às vezes, das pirâmides o quedo
E atro perfil, exposto ao luar, parece
Uma sombria interjeição de medo!

Como um contraste àqueles misereres,
Num quiosque em festa alegre turba grita,
E dentro dançam homens e mulheres
Numa aglomeração cosmopolita

Resplandece a celeste superfície.
Dorme soturna a natureza sábia...
Embaixo, na mais próxima planície,
Pasta um cavalo esplêndido da Arábia.

Vaga no espaço um silfo solitário.
Troam kinnors! Depois tudo é tranqüilo...
Apenas como um velho stradivário,
Soluça toda a noite a água do Nilo!

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Até mais